De Jandira Feghali*
O Rio de Janeiro tem uma história vinculada à construção da nação brasileira. Capital do Brasil no período colonial, desde 1763, e durante a época do Império. E capital depois de proclamada a República, em 1889, até o ano de 1960, quando se inaugurou Brasília. São 197 anos em que o Rio foi a matriz a partir da qual se impulsionou e se coordenou a construção nacional.
Naturalmente, nosso estado se beneficiou ao desempenhar esse papel, mesmo que a indústria aqui criada, sobretudo a partir da Revolução de 30, tivesse acentuado caráter nacional, com o objetivo de dotar o país de indústrias de base. Como exemplo, temos a Companhia Siderúrgica Nacional (Volta Redonda), a Companhia Nacional de Álcalis e a Fábrica Nacional de Motores. Em 1938, criou-se o Conselho Nacional do Petróleo, com sede no Rio de Janeiro. Um ano depois, perfuramos o primeiro poço no qual se encontrou petróleo no Brasil. Era o de Lobato, na Bahia. Também no Rio, em 1953, foi fundada a Petrobras, cuja sede continua até hoje em nossa cidade.
A mudança da capital para Brasília foi feita de forma acelerada e sem compensações para o Rio. Acarretou diversos prejuízos ao estado, como a perda de várias instituições, embaixadas, bancos e pessoal qualificado em diferentes áreas. O Rio manteve, no entanto, um imenso patrimônio edificado, com reconhecido valor arquitetônico. Uma beleza única, com necessidades constantes de serviços de preservação, mas sem quaisquer recursos federais para a sua manutenção.
A partir de 1974 começa a se abrir uma nova perspectiva para o Rio de Janeiro. No fim daquele ano, precisamente no dia 23 de novembro, a Petrobras descobre o campo de Garoupa. O achado é seguido por diversos outros, formando aquilo que veio a se tornar a grande área petrolífera do Brasil. Na Bacia de Campos está o campo de Marlim, o maior do país. A natureza, sempre pródiga com o Rio, parecia fazer uma compensação em óleo pelas perdas advindas com a mudança da capital.
Mas eis que, na Constituinte de 1987, o Rio sofre uma nova e pesada perda. Ao se estabelecerem no texto constitucional as regras para o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ? imposto estadual básico, cobrado no estado onde ocorre o fato gerador da produção da mercadoria ?, introduziu-se uma exceção, justamente para o caso do petróleo, assim prevista: "Nas operações com os lubrificantes e combustíveis derivados de petróleo, o imposto caberá ao estado onde ocorrer o consumo" (artigo 155). E, assim, o Rio só ficou mesmo com os royalties do petróleo. Que agora querem tirar!
Tem-se travado verdadeira batalha em torno da destinação dos royalties do petróleo. No mérito, os estados produtores têm um terreno sólido, no qual devem se firmar. A Constituição estabelece no parágrafo primeiro de seu artigo 20 que fica assegurada aos "estados, ao Distrito Federal e aos municípios... participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural... no respectivo território... ou compensação financeira por essa exploração".
Nesse sentido, a postulação de distribuição igualitária dos royalties, entre quem produz e quem não produz, é abertamente inconstitucional, além de mudar regras do jogo em contratos já firmados. É isso que prevê a Emenda Ibsen. A emenda do senador Simon incorre no mesmo erro, induzindo a uma ilusão: procura amenizar o problema, mencionando que a União pagará por prejuízos nos estados produtores, mas sabe-se lá com que dinheiro...
Do ponto de vista tático, precisamos perceber que o Rio está perdendo essa batalha. Talvez seja necessária uma mudança. Os estados do Rio e do Espírito Santo não estão contra o Brasil ? o Rio nunca foi contra o Brasil, ao contrário, ajudou a construí-lo. Na frente parlamentar, na qual essas questões são decididas, o puro confronto com a maioria ? sabemos bem ? é derrota anunciada.
No quadro atual, de dificuldades já estabelecidas, é conveniente não se aceitar a votação da Emenda Simon na Câmara antes da eleição. Os deputados não votariam contra seus estados neste momento. O interesse eleitoral, muitas vezes, se sobrepõe ao bom-senso. Assim, especialmente no ambiente parlamentar, faz-se necessário um empenho pelo diálogo ? por meio da persuasão, com argumentação consistente e veemente, e apresentação de alternativas. Deve-se procurar todo o apoio da base governista e do próprio presidente Lula, que tem se revelado sensível a essa questão. E, em articulação com esse esforço parlamentar, devemos cuidar da pressão social.
Todas as ações devem ser imediatas e em todos os campos de atuação. No Parlamento, junto aos governos e na Justiça. Posicionar-se ao lado dos estados produtores, e particularmente do Rio de Janeiro, é defender o legal, o legítimo, o justo. É colocar-se junto ao nosso povo. Defendo, ainda, que os recursos advindos do petróleo sejam socialmente controlados, com aplicação garantida e investimentos transparentes nos setores mais necessários à população.
*Jandira Feghali exerceu os cargos de secretária de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia de Niterói e o de secretária municipal de Cultura do Rio (administração Eduardo Paes). Foi deputada estadual e quatro vezes deputada federal pelo PC do B do Rio.
Artigo publicado no Jornal do Brasil em 15 de junho de 2010
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