sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Acordo extrajudicial dispensa homologação, decide STJ


23/11/2012 
Fonte: Jornal do Commercio
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou homologação de acordo extrajudicial, por falta de interesse das partes. "O Poder Judiciário não pode ser utilizado como mero cartório que incluirá, em documentos submetidos à sua sumária avaliação, um mero selo, que sequer pode ser chamado selo de qualidade, porque não é submetido, do ponto de vista substancial, a seu controle efetivo", disse a relatora, ministra NancyAndrighi, em seu voto, que em- basou a decisão da Corte.

Para a relatora, não há utilidade em homologar judicialmente um acordo extrajudicial, em que partes capazes transigem sobre direitos disponíveis, com assistência de seus advogados, por meio de instrumento particular, na presença de duas testemunhas. "Admitir que acordos extrajudiciais se transformem em títulos executivos judiciais, tal qual pretendido, seria imaginar uma atividade cognitiva judicial que efetivamente não ocorreu", acrescentou a ministra.

Para ela, esses acordos devem ser negociados fora do processo, com a participação dos advogados, figuras indispensáveis para a administração da Justiça. Não se deve, porém, envolver o Judiciário nesses procedimentos. Segundo a relatora, há um processo legislativo de democratização do direito, evidenciando uma tendência à "desjudicialização dos conflitos" e valorização das negociações extrajudiciais, com o afastamento da autoridade judiciária do papel de mera chanceladora.

A ministra esclareceu ainda que o dispositivo processual que permite a homologação judicial de transação extrajudicial exige a existência de uma lide submetida previamente à jurisdição. Gu seja, o acordo poderia abarcar conteúdo mais amplo que o da lide em trâmite, devendo ser, então, homologado. Esse dispositivo do Código de Processo Civil (CPC), o artigo 475-N, teria suplantado na legislação processual geral o artigo 57 da Lei 9.099/95, dos juizados especiais cíveis.

Ambiente fluido

"As normas processuais têm sido criadas para possibilitar o melhor desenvolvimento dos processos, num ambiente fluido no qual as partes tenham a possibilidade de postular e receber sua resposta do estado de forma rápida e justa", afirmou a ministra. "Nesta hipótese, porém, não há qualquer lide subjacente a exigir a propositura de uma atuação judicial, tampouco se está diante de uma hipótese de jurisdição voluntária, em que a lei obriga as partes a buscar o Judiciário como condição para o exercício de um direito", completou a relatora.

"O acordo aqui discutido, substancialmente, é uma transação extrajudicial e já está dotado de sua eficácia específica de título executivo extrajudicial. Não se pode admitir que as partes tenham interesse jurídico em transformar algo que substancialmente está correto em algo fictício, em algo que, do ponto de vista da moral e do direito, nâo encontra fundamento de validade", concluiu a ministra.

Joaquim Barbosa: 'Há um déficit de justiça'


23/11/2012 – 09h37

Fonte: jornal O Globo

Numa solenidade prestigiada por políticos, artistas e autoridades do meio jurídico, o ministro Joaquim Barbosa tomou posse ontem na presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) criticando a desigualdade no acesso à Justiça, defendendo a independência do juiz e condenando a atitude de pedir favores a políticos para facilitar promoções na carreira de magistrado. Ele afirmou que os magistrados devem respeitar os anseios da sociedade em suas decisões.
 
Ao lado de Joaquim, a presidente Dilma Rousseff acompanhou toda a sessão com ar de poucos amigos. A parte mais dura, com recados de que o STF não se curvará a interesses de algozes, foi reservada para o discurso do ministro Luiz Fux, escolhido por Joaquim para falar em nome da Corte. Antes de fazer o pronunciamento, Fux submeteu o texto ao novo presidente.
 
O Judiciário a que aspiramos é um Judiciário sem firulas, sem floreios, sem rapapés 
Joaquim Barbosa
presidente do STF
Joaquim defendeu igualdade para todos no acesso à Justiça - algo que ainda não existe no Brasil, segundo ele mesmo. "Ao falar sobre o direito da igualdade, da igual consideração, é preciso ter a honestidade intelectual para reconhecer que há um grande déficit de justiça entre nós. Nem todos os brasileiros são tratados com igual consideração quando buscam o serviço público da Justiça. Gastam-se bilhões de reais anualmente para que tenhamos um bom funcionamento da máquina judiciária. Porém, o Judiciário a que aspiramos é um Judiciário sem firulas, sem floreios, sem rapapés. O que buscamos é um Judiciário célere, efetivo e justo. De nada valem as edificações suntuosas, sofisticados sistemas de comunicação e informação, se naquilo que é essencial a Justiça falha", declarou.
 
Sobre a independência dos juízes, o novo presidente afirmou: "É preciso reforçar a independência do juiz, afastá-lo desde o ingresso na carreira das múltiplas e nocivas influências que podem paulatinamente minar-lhe a independência. Essas más influências podem se manifestar tanto a partir da própria hierarquia interna a que o jovem juiz se vê submetido, quanto os laços políticos de que pode às vezes se tornar tributário na natural e humana busca por ascensão funcional e profissional. Nada justifica a pouco edificante busca de apoio para uma singela promoção de juiz do primeiro para o segundo grau".
 
Interrompido por aplausos efusivos dos presentes, Joaquim concluiu: "O juiz, como entre outras carreiras importantes do Estado, deve saber de antemão quais são as suas reais perspectivas de progressão. E não buscar obtê-las por meio da aproximação ao poder político".
 
Antes do novo presidente, discursou o ministro Luiz Fux, com recados duros aos críticos do STF. Ele afirmou que o tribunal está unido para combater eventuais adversários: "A democracia brasileira funciona a todo vapor, e esses novos desafios não poderiam se encontrar mais bem capitaneados no Supremo Tribunal Federal pela mente e pelo coração de Joaquim Barbosa. E pela união institucional e espartana da Corte, preparada para julgamentos mais árduos e para o confronto eventual contra qualquer força oposta aos seus julgados, quer pretendam macular a instituição como um todo, quer elejam eventuais algozes para encobrir os desmandos movidos por desvarios e insensatez antirrepublicanos", afirmou.

No mesmo discurso, antes de dar os recados, Fux fez elogios à presidente Dilma Rousseff, que estava presente e mantinha o semblante rígido. Ao cumprimentar Joaquim pela posse, no plenário do STF, Dilma apertou-lhe a mão e não sorriu. Ricardo Lewandowski, empossado vice-presidente, ganhou um abraço. Não estavam presentes ministros petistas como Gilberto Carvalho, Ideli Salvatti, Aloizio Mercadante e Fernando Pimentel. Já os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da Defesa, Celso Amorim, compareceram.

O Supremo Tribunal tem agido com inegável respeito às legítimas manifestações dos outros Poderes da República
Luiz Fux
ministro do STF
"O Brasil experimenta um momento único em sua história. A passos largos, trilhamos, em meio a um cenário internacional, que é deveras desfavorável, o caminho da prosperidade e da pujança econômica. Tudo decorrente dos exemplos de amor à coisa pública e da subserviência à ética no poder por parte da nossa chefe suprema, a presidente Dilma Rousseff", disse Fux.
 
Aplaudido pela plateia, Fux continuou, reiterando que os juízes são independentes: "Nós, os juízes, não tememos nada nem a ninguém. A independência dos juízes, aquele princípio institucional pelo qual no momento em que julgam eles devem sentir-se desvinculados de toda e qualquer subordinação hierárquica, é duplo privilégio, que impõe a quem o desfruta a coragem de ficar a sós consigo mesmo, frente a frente, sem se esconder atrás da ordem superior".
 
Joaquim: juiz deve atender anseio da sociedade
 
O ministro também disse que o STF, diferentemente do que se diz, não usurpa funções do Executivo ou do Legislativo em seus julgamentos sem ter sido eleito pelo povo para atuar. Para Fux, é necessário que um órgão composto por juízes, e não por políticos, fiscalize o cumprimento da Constituição Federal.
 
"O medo de um governo de juízes, externado pelos críticos dessa alvissareira era, sequer encontra respaldo na praxe de atuação da Corte Constitucional, dado que o Supremo Tribunal Federal tem agido com inegável respeito às legítimas manifestações dos outros Poderes da República", disse.
 
No discurso, Joaquim disse que os juízes devem atender aos anseios da sociedade, embora não devam ser subservientes aos clamores públicos. "Pertence definitivamente ao passado a figura do juiz que se mantém distante, indiferente, para não dizer inteiramente alheio aos anseios fundamentais da sociedade na qual está inserido. Se é certo que a noção de liberdade comumente aceita entre nós impede que se exija a adesão cega do juiz a todo e qualquer clamor da comunidade a que serve, mais certo ainda é o fato de que, no exercício da sua missão constitucional, o juiz deve sim sopesar e ter na devida conta os valores mais caros à sociedade na qual ele opera", declarou.
 
O ministro Lewandowski, que teve várias divergências com Joaquim durante o julgamento do mensalão, também foi elogiado nos discursos realizados na posse. Entre os feitos destacados esteve a defesa da constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, que impede a candidatura de condenados em órgãos colegiados. O ministro Fux também ressaltou que Lewandowski foi relator de ações importantes, como a que garantiu a constitucionalidade do sistema de cotas nas universidades, e a que vetou o nepotismo no serviço público.